Deep Blue


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Para a minha cachorra

Dois mil e doze e as duas rupturas.

Não vou mencionar a primeira ruptura de 2012. O assunto cansou, desbotou, não morreu, mas enjoei. Não daquela forma como se enjoa do mesmo sorvete que você cismou de tomar todos os domingos no verão. Eu simplesmente resolvi aceitar e deixar o assunto morrer. A verdade é que eu sofri uma outra ruptura bem mais profunda. Doeu muito  mais. Minha cachorra morreu. Escrevi um post um mês antes da despedida da minha melhor amiga, depois disso, até hoje, nunca mais havia conseguido escrever. Eu ia voltar para o blog, mas doeu tanto que acho que até esqueci. Desde o começo do ano, sabia que a dor não tardaria. Os sinais de velhice tornaram-se cada vez mais evidentes: os olhos ficaram cansados e foram da nitidez ao vulto e depois, do vulto ao nada, tudo aos poucos. Tudo ficou mais lento. Tudo ficou mais difícil, confuso. E então, veio o câncer, linfoma, que a levou mais rápido do que imaginava, deixando um vazio que chegou beirar o insuportável.

Eu sabia que deveria deixar você ir embora. Sei que você estava cansada. Que fez tudo que poderia (aliás, fez muito mais, cumpriu uma linda missão de amor e pureza nesse plano).Por algum tempo, depois do dia de sua partida no dia sete de dezembro, ainda tinha a impressão de ouvir suas patinhas andando pela casa, senti cheiros, desejei abraçá-la uma última vez. A tristeza foi grande e cheguei a pensar que seria pra sempre. Mas agora estou bem. De onde estiver, não se preocupe comigo. Não há um dia sequer em que não pense em você. Mas as lágrimas são bem menos freqüentes e foram, na maior parte do tempo, substituídas por lembranças maravilhosas, que ninguém jamais poderá levar embora. Poder lembrar de você pra sempre é um presente.

Acredito que toda vez que a vida nos obriga a buscar fortaleza diante da dor, algo dentro de nós se transforma para sempre. Dois meses e quinze dias após a partida da minha melhor amiga, não posso deixar de registrar, mais uma vez, a minha gratidão. Gratidão pelo amor incondicional, beijos gratuitos, companhia indispensável e muita, muita, muita alegria. Luna, se hoje enxergo a vida sob uma perspectiva canina, se hoje posso afirmar com tanta convicção que os cães são melhores que os humanos, e se desejo conviver com cães para o resto da minha vida, é porque você me ensinou tudo isso. Sou eternamente grata pelos 13 anos e 11 meses de amor condicional que você dedicou a todos nós. Sei que nunca serei capaz de amar como você nos amou, dessa forma tão pura, desprendida e profunda, tão canina. Mas obrigada por ter tentado me ensinar. Você permanecerá no meu coração “só enquanto eu respirar.” Amo você.


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Durante a insônia do Cão Alfa…

Na ausência do Humano Beta, o Cão Alfa fica com insônia. Aliás, o padrão insônia dela tem se repetido com uma certa freqüência ultimamente. E eu me pergunto o que leva um cachorro a ter insônia se está pouco preocupado com o valor das contas que tem a pagar e se o dinheiro vai dar ou não até o fim do mês? Engraçado como em tempos de praticar o desapego, o cão é mestre na prática, mas não faz a menor ideia de como praticar o desapego relacionado ao seu humano. É claro que eu fico preocupada e me pergunto se isso é só mais um sinal de velhice. A velhice é aquela coisa natural com a qual ainda não aprendemos a lidar direito. Hoje consegui assistir “O Pequeno Buda” até o fim, filme que recomendo a pessoas que como eu, se sentiram de alguma forma compelidas a estudar o Budismo. Vários ensinamentos de Siddartha Gautama são citados ao longo do filme, entre eles alguns referentes ao desapego. Percebo que esse é um dos grandes desafios desse ano: ver meu filho ir embora e a velhice tomar conta do meu cão mais um pouquinho. Nada é eterno, e se encontrássemos um pouco de paz para lidar com isso, tudo seria um pouco mais fácil. Agora o cão alfa dorme no meu travesseiro. E como faz aproximadamente duas horas que estou tentando fazê-la ficar quieta, estou sentada ao lado e não ouso me mexer.

Enquanto isso, entro no Facebook, esse vício humano dos últimos anos que se tornou a principal fonte de comunicação entre pessoas. Ainda prefiro o telefone ou visitas pessoais, mas como elas raramente ocorrem, eu apelo pro Mark Zuckerberg. E assim, confirmo a existência em massa de uma das coisas que eu denomino “Mal do Século XXI” (alguns deles): A histeria e o masoquismo. Nos últimos anos, escolhi ficar em São Paulo em feriados como Carnaval, Páscoa, Natal, e Ano Novo. Porque eu acredito que pegar a estrada só para “dizer que foi à praia” em feriados como esses é suicídio. Tempo de descida São Paulo – Praia Grande: 30 horas. Conheço alguém que demorou 10 horas para fazer Mongaguá – Santo André há dois anos, no ano novo. Sim, DEZ horas, para fazer um percurso que leva geralmente, uma hora no máximo. Sério, pra que toda essa histeria social “eu, paulistano, preciso ir pra praia no feriado e passar 10 horas dentro do carro comendo biscoito de polvilho”? (no final da viagem, o biscoito leva a ferro e fogo seu apelido “isopor”).  Eu não vejo onde isso pode ser divertido. Tire férias em outubro e vá para a praia. Bem mais saudável. Mas não ouse descer no dia 12 ou véspera de Finados. É suicídio.

Cão Alfa “apagou” mesmo no meu travesseiro. Preciso esperar que ela saia do sono alfa, entre em beta e caia em REM para que eu consiga me mexer. Enquanto isso, arrumo o que fazer no escuro enquanto Alfa e seu fornecedor de bifinhos clandestinos se entregam aos braços de Morfeu…


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Pra lá de Bagdá

Você – professor – percebe que mal voltou de férias e já pegou o trem bala quando resolve elaborar a atividade inteira de uma das aulas do dia seguinte no chuveiro. Foi mais ou menos assim: cheguei em casa revoltada por ter pago trinta reais do meu salário fabricado quase no tapa no estacionamento, de TPM, fiz um wrap meio light, tomei um copo de leite e fui tomar banho. Claro que uma pessoa que tem trabalho das sete às vinte e duas não teve tempo de lavar a camiseta do uniforme, e portanto pendurei cuidadosamente a camiseta no corrimão para reciclagem. Que vergonha. Não tenho forças para acordar às três horas da manhã e lavar a minha roupa, o que significa que o dia que “o sonho da casa própria casa se concretizar” (baú do Silvio? Portas da Esperança? De onde veio essa expressão mesmo), serei uma péssima dona de casa. Graças a Deus, porque eu não nasci pra isso mesmo. Mesmo com a fome de leão que estava, por não ter passado as últimas semanas como de costume – preenchendo o meu vazio interior com chocolate – fiz a caridade de dividir o meu wrap light, com peito de peru e requeijão light com o ser marrom de vão livre (daschund) que abanava o rabo com os seus olhos magros de uma cachorra anêmica (é assim que ela se vê. Ela é gorda). Logo em seguida, peguei o DVD do filme Up (o melhor filme Disney-Pixar) para preparar a atividade para a minha aluna. E como alguém que não fez mais nada além de trabalhar das sete às vinte e duas, tomei banho com o meu laptop virtual cerebral ligado, e digitei toda a atividade na minha cabeça. É claro que amanhã eu vou descobrir que meu HD com capacidade 1,5 (Tico e Te…) deu aquele pau e toda a inspiração para trabalhar em cima da história de Sr. Fredericksen, Russel e Dug – o cão mais simpático de desenhos animados de todos os tempos – foi pelo ralo enquanto eu tomava banho. Não faz mal, com um pouco de sorte e esforço, ela vai voltar.

Ah, sim, os livros: terminei de ler Através do Espelho de Jostein Gaarder. É uma viagem maravilhosa na história do “por que?”, “para que?” e “será?”. Vale a pena. É um daqueles livros que você lê bem rapidinho e se apaixona pela história, da mesma forma como “O Velho e o Mar”. Agora tenho uma fila boa e vai rolar uma disputa para saber quem vem primeiro, mas acredito que será “Não contem com o  fim do livro”, de Humberto Eco. Os outros da fila são “Flush, memórias de um cão”, de Virginia Woolf e “Em defesa de Israel” de Alan Dershowitz. Mas se você tiver alguma outra sugestão, por favor, é só colocar aqui. Será muito bem vinda.

São treze minutos do dia 19 de janeiro. Daqui a poucas horas eu levanto e reinicio tudo. Então é preciso tentar desligar os HDs aqui – do laptop e o meu próprio HD porque estou pra lá de Bagdá. E falando nisso, você leu “De Bagdá, com muito amor” de Jay Kopelman?


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“Sempre Ao Seu Lado” para partir seu coração

PS: NÃO LEIA ESSE TEXTO SE O FILME “SEMPRE AO SEU LADO” ENCONTRA-SE NA LISTA DE FILMES NÃO ASSISTIDOS QUE VOCÊ ADORARIA VER. PRESENÇA DE COMENTÁRIOS A RESPEITO DO DESFECHO DO ENREDO E O LINK PARA A ÚLTIMA CENA ENCONTRAM-SE NO FINAL DO TEXTO.

Nada melhor para cinéfilos do que começar o ano com um bom filme. E esse programa da Net é realmente tudo de bom: escolha a sua opção de cardápio de filmes inclusos no preço, estoure a pipoca e divirta-se. Ou chore. Eu tenho um sério problema com essa história de chorar em filmes. Se é para chorar, que seja sozinha. Sinto-me constrangida de chorar na frente de outras pessoas. Por isso sempre disse a mim mesma que se um dia tivesse coragem suficiente para assistir “Sempre Ao Seu Lado”, que fosse sozinha. De preferência, sem a Luna, porque olhar pra cara dela durante o filme iria desencadear mais tristeza. Mas hoje de manhã, enquanto tomávamos café, e a Luna encontrava-se esparramada no sofá como de costume, meus pais resolveram assistir o tal filme. Imediatamente peguei meu laptop e tentei forçar a atenção para qualquer coisa banal, tarefa difícil quando no fundo você está se contorcendo de curiosidade e domina o idioma original do filme. Para piorar, Richard Gere faz papel de um professor de música, fazendo com que o som background do filme fosse música clássica de tom muito triste – perfeito para tornar o espectador em manteiga instantânea na frigideira. Pronto. O filme me cativou. Eu tentava desviar a atenção para qualquer outra coisa, mas todos estavam assistindo e eu não poderia simplesmente me trancar no quarto do meu filho, ligar no Discovery Kids e dançar junto com a Stephanie em “Lazy Town” e ignorar um lindo filhote de Akita perdido. Desisti do laptop e me entreguei ao açúcar canino. O filme é extremamente bem feito, daqueles que transporta você, Manteiga Pura, para dentro da tela e o faz viver todos os sentimentos do protagonista (Hachiko, o cão). O diretor, muito esperto, soube colocar o expectador sob a perspectiva canina em diversos momentos ao longo do filme. Determinadas cenas são em preto e branco e a imagem vira de ponta-cabeça quando Hachiko resolve deitar de costas na grama do jardim. Hachiko acompanha seu dono diariamente à estação de trem, e volta para esperá-lo chegar do trabalho. Um dia, porém, o personagem interpretado por Richard Gere sofre um ataque cardíaco durante a aula e morre. Mas o cão nunca o esquece. Todos os dias, o devoto e paciente Hachiko espera seu mestre retornar àquela mesma estação… até o fim de sua vida. O cão passa a vida ganhando a atenção e carinho das pessoas que trabalham e transitam pela estação, inclusive, um amigo pessoal do protagonista. O filme desenrola-se dessa forma e vai quebrando aos pouquinhos o coração do espectador, da primeira cena, à cena final. O desfecho é o momento mais emocionante do filme, conseqüentemente, o que mais chorei. Hachiko morre e o espírito do personagem interpretado por Gere vem buscá-lo na estação. Nesse exato momento, paro de escrever o texto e choro mais um rio de lágrimas ao rever esta cena no Youtube, tiro o óculos, respiro fundo e admito que estou emocionada demais para colocar meus pensamentos em ordem e terminar este texto. Há alguns sentimentos profundos demais para serem descritos num blog. É difícil assumir que essa emoção tão forte vem, principalmente, do fato de ter um cachorro em casa e ter a consciência  que a vida dela é bem mais curta que a minha. Os cães são assim. Têm a vida breve porque possuem um papel muito complicado: ensinar ao ser humano o valor do amor puro sem usar sequer uma palavra. Difícil, não é? São verdadeiros anjos de quatro patas. Geralmente, diferente do enredo do filme, somos nós quem os assistimos partir. E talvez devemos deixar o egoísmo de lado, praticar a difícil arte do desprendimento e assumir que o melhor é torcer para que assim seja mesmo, e não o contrário. Somos dotados de alma imperfeita, ao contrário dos cães, mas somos um pouquinho mais capazes de compreender que às vezes é necessário nos despedirmos das pessoas e animais que amamos. John Grogan sofreu a perda do Marley, seguiu a vida e encontrou no seu próprio livro a forma de lidar com a dor. Essa dor da perda, algo que nos assusta e às vezes nos tira o ar e o sono. Sabemos que nossa vida deve continuar quando a de alguém que amamos é interrompida. Mas como explicar isso a um cão?